1. |
Urtica Ardens
06:16
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eu em ti
e teus cicios
asseverando
debaixo dos lençóis
“eu te amo tão macio”
“eu te segui
desde outras vidas até aqui”
tua vitória
tens em mim
está em tuas mãos
eu te amo, minha senhora
quem de nós vai buscar algo
pra ajudar acordar melhor?
“já que amanheceu nublado
e faz tanto frio
porque não ficamos por aqui?”
eu te perdi
nos teus desvios
murmurando a própria comoção
pelos cômodos da casa
você me põe tão arredio
arredio
sussurrando as tuas falhas
de conduta ao meu ouvido
doendo-se pelos cantos
nas tuas brumas turvas
nas tuas curvas que nunca atingi
“eu menti
e vim de outras vidas até aqui
pra rescindir meus pesares
desatar os nós
agora vai, que eu vou daqui
sozinha”
“eu vou”
não vai sozinha
você perdoe a palidez de minha luz
que soçobrou
e a projeção dessa sombra
tenebrosa sobra além de mim
e se distorce bem maior que eu
o amor, a meu ver
sempre foi deixar
você sair, ir e vir, livre pra voltar
quando quiser
quando quiser voltar
por que não paramos por aqui?
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2. |
Teses Taxistas
03:57
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como quem sonha com sede
cede à sedução dos anseios mais primordiais
até as brechas mais vagas da imaginação
mil artifícios conduzem o leigo à preguiça
em cada imagem a máxima de um preconceito
hordas de bárbaros mansos que a plenos pulmões
difundem suas teses de taxistas
e o coração azul do pai palpita
e traduz o injusto com aplausos
ao ver privilégios onde há direitos
larvas abortadas no quintal de casa
prosperam com o espólio incauto da safra
formada por jovens mais velhos que eu
minha nostalgia serve a isca
instiga o fetiche, projeta uma cifra
no olho de vidro do CEO da empresa
larvas abortadas no quintal de casa
prosperam com o espólio incauto da safra
formada por jovens mais velhos que eu
minha nostalgia serve a isca
instiga o fetiche,projeta uma cifra
no olho de vidro do CEO da empresa
a fé que é cega
a seu defeito
o despreparo da polícia
a distração de ser artista
e a instrução da classe média
média
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3. |
Rosa Ferrugem
05:46
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espero que aceite o espresso fresco
corante que entorna escuro
passado com esmero
amaro
só pra manter esse teor
de um paladar que destoa
como me tortura má
essa ternura
pá de cal
um gosto penso
escoa ao seu lado oposto
o meu desprazer
tem que equivaler a esse sabor
de doce basta a vida
no decorrer dos meses
em que passo na espreita
enquanto você se vai
eu tento me portar bem
me conformar
um tom vermelho aferroado
tempero sal amargo
como me tortura má
essa ternura pá de cal
que cultivas em torno de si
um gosto penso
escoa ao seu lado oposto
rosa ferrugem
água de quinino
temperamentos
qualquer coisa me arrasta
às agruras das minhas raízes
do bíter de angostura
à temperatura
gin zimbro seco
amar gor
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4. |
Empirimístico
03:42
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vê se parece uma razão de ser
apesar de todos os percalços que atravesso
sei que ainda tenho lá meus predicados
esperando pra nascer
em papel ou em você
de fato eu preciso descobrir
uma forma de viver
um dia após o outro
sem sofrer oscilações
do sacro humor que rege a vida
e promove as decisões
me diz qual é o segredo dos sensatos?
quando estou de bem comigo eu deixo vir
o peso que se encosta em mim
disfarço e saio bem na contramão
caso não se faça aquilo que se quer
na vida uma cadência torta
vale o comodismo da ilusão
e eu que gostava do azar
dizia me esquivar com graça dos buracos
mas sempre me via num
refutando o fardo que me cabe
visitando os meus infernos
ora sim e ora não
e hoje eu reconheço
que meu descompasso
é fruto do que fui até aqui
mas ainda tiro um riso fácil
das situações mais adversas
e que talvez lidar com os impulsos do coração
se torne uma contradição
ontem você soía se exaltar
e desbocado fez calar até a mãe
e hoje na crista de qualquer distração
invoca a teima mas vive na corda bamba
falando pouco
amando menos
dizem ser louco
talvez ingênuo
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5. |
Sagração
08:51
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(outono)
na água gelada do teu rio
o batismo que inicia
o meu outono em tom febril
é amarelo
molha as minhas folhas e leva
vela, Ofélia, por mim
milagres ou quimeras
ora, ora por mim
nas águas passadas do teu rio
é tanto banho de água fria
como de praxe
pela terceira vez num mês
vai chover, chover, chover
pra amadurecer, amor
(primavera)
num passado
tempos idos
eu calado, constrangido, enfim
pude crer, minha vez está
finalmente aqui
que aurora tão minguada
constituição mirrada
florescendo tênue e sacra
a tenra mocidade
eu, receoso juvenil,
o meu peito treme e arqueja
e você sem dó,
teu vestido leve
despeja
um frêmito encarnado
e eriça o meu pudor
ofegante face a face
tão efêmero mal nasce e já esvai
minha senhora
nas alturas puras plenas
sua alteza serena
você vai me deixar essa noite
um ramo invisível de alívio e dor
mil calafrios vão da candura ao rubor
tudo é tão triste tão belo tão revelador
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6. |
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agitado em meio ao desespero de um alarme falso
eu distingui sem alucinação
Vênus que padece o mal de Alzheimer passou perto de você
mas preferiu a mim
já era tarde eu clamava em vão
deusa sacana essa burla é antiga
por favor suma daqui mas não se esqueça dela não
tudo o que eu queria era poder te ver sambar deitada
até aquele dia em que você topou jantar no japonês
riu de mim quando eu tentei com os hashis
e pra engrosso do escracho fez lembrar
que eu sou um sem noção
que a luz da minha casa é a lua
que meu alaúde é um violão
é um violão
eu era da turma do Juninho
que se esconde pra falar de amor
uma vez surpreso no caminho
delatei meu ato com rubor
não conheço o melhor restaurante
mas tenho uma pá de livro bom
Dante, Safo, Pound e essência
de Cortázar e Carlos Drummond
e a gente convida um vinho tinto
e o que de melhor a Bossa tem
que é essa sensibilidade extrema
pruma vida plena e frugal
que uma farra boa a gente faz
nesse paisinho tão difícil
em verão sem praia ou dia frio
em finados ou quartas de cinzas
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7. |
Poxa
02:44
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eu que pensei tanto em te dizer
coisas de ouvir e se gabar
não custava muito pra entender
um desejo humano e natural
mas na hora H perdi o ar
do ponto alto eu fui mais raso
que nem ela pôde acreditar
eu que faço pouco do que quero
e do desejo eu sou vassalo
incapaz de entender
comigo desaprendo
e num esforço em vão
desesperado eu tentei me explicar
errar eu sei é bem normal
mas quinze vezes só eu
ai meu...
você me olhava e eu já sem juízo
perguntava pra mim mesmo
se o que te comovia era piedade
ou riso
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8. |
Abafado
05:25
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eu desejo que todo meu suor
seja enxugado pelos lençóis
você avisou mas não chegou em mim
de um grande calor sem fim
invente algum motivo pra me assoprar
pode me morder se se desculpar
está na hora de trocar a lâmpada
muito embora este ambiente denote intimidade
pode fazer arder seus olhos
meu amor
do começo ao fim do singelo cômodo
conto apenas dez passos
mas no final do dia
vai amenizar
e os pássaros vêm tranquilos
(bem-te-vi)
se eu derreter
e você também
nós vamos mesclar num só
abafado
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9. |
Irresoluto
04:41
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lá vem você oscilando diante dos “porquês”
cautela antecipada traz um bem paliativo
custo benefício do lucro relativo ao fim do mês
além, aquém
vagando nesse vai e vem
um passo pra trás
mais dois adiante
diante dos bloqueios lá vem
seus novos revolteios
nutro um receio
quero estacionar
não te cansa a dança?
eu e você nesse pas-des-deux
no qual só se avança
diante do conforto de retroceder
se não te cansa dança
eu e você nesse pas-des-deux
no qual só se avança
diante do conforto de retroceder
todavia ainda nem brotou um mal pra ultrapassar
se vier a força contra a consumação
também virão recursos pra atenuar
a qualquer momento os planos sofrem uma violação
mantenha o andamento
irresoluto
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10. |
Arrebol
04:32
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não consigo mais manter o meu humor
qualquer pressuposto basta
pra desencadear o meu rancor
na catraca do metrô querem passar três
é tão desolador o Anhangabaú
depois das seis
no fim do horário comercial
o itinerário é pra acabar comigo
não tenho precedentes de sucesso
no meu menor ingresso duas horas, três reais.
a luz deixou a atmosfera fosca
fechando o lusco-fusco
no congestionamento da capital
atingimos um montante expressivo
na parcela do imposto não contém
o desgosto de encarar duas conduções, um trem?
o sol se pôs no contraponto do farol
arrebol
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